terça-feira, 14 de outubro de 2014

Terceira Noite - parte 2


O Simbiose Street Dance (Três Lagoas) foi quem abriu a última noite de Mostra Aberta, com a coreografia “Bantô”, criada por Márcio Bruno, dirigida por Marcos Mattos. Bantô usa elementos de danças rituais, com danças urbanas, música eletrônica e todo um repertório de corpos sensuais - bastante difundido em mídias e redes sociais e, talvez, por isso, desperte tanta identificação na plateia, que vibrou junto com os dançarinos.
Grupo Simbiose em "Bantô".
A noite contou com outras apresentações de danças urbanas como a criação coletiva “Protótipo”, do Grupo Conexão Urbana. Interessante a maneira como incorporou jogos teatrais à composição coreográfica, que simulavam o controle "remoto" de uns sobre o movimento dos outros.
Grupo Conexão Urbana em "Protótipo".
 
O Grupo Expressão de Rua apresentou "Soul train", criado por Zeka de Souza.
Grupo Expressão de Rua em "Soul Train".
O que essas coreografias me fazem pensar é em como alargar o entendimento do que é "urbano", quais temáticas para além das tecnologias - como em protótipo e na musicalidade eletrônica, com batida maquínica - poderiam servir de ignições para as criações desses estudantes? Quais tensões, opressões, impressões, ações e resistências são performadas nas cidades hoje, em Mato Grosso do Sul, e que podem servir de material de observação, pesquisa e criação para quem se interessa pelas chamadas danças urbanas?

A artista convidada Fabgirl, de Brasília, apresentou o solo “Pense coisas boas”, dirigido por Sandra Kelly Lim. Essa coreografia faz parte do espetáculo “Breaking the dance: quebrando tabus de gênero na dança breaking".  A temática do trabalho dá indícios da relação entre criação artística e ação social, vinculada ao terceiro setor, ou seja, a arte como campo para promover discussões de relevância social.

O chapéu é um objeto cênico bastante utilizado em coreografias de sapateado e foi também usado em "Keep time", coreografada por Gabriela Fioravante, do Studio de Dança Mayara Martins. Acredito que um dos objetivos do experimento cênico, encenado por estudantes de dança, seja o de incorporar repertórios já existentes, diferente dos artistas-criadores cujo processo criativo envolve superar o que já existe ou lidar de uma maneira singular com o senso comum ou estereótipos, para dar corpo às suas obras. 
“Serenidade”, do Grupo Imagens, de Campo Grande, trouxe para a noite o encontro entre o balé e uma concepção que pode ser chamada de moderna da dança, por dar destaque ao tratamento das emoções, a uma “expressão” de sentimentos. “Balé”, porque dá para ver, claramente, que o treinamento dos corpos que se apresentavam em cena, é o dessa técnica clássica. 
Grupo Imagens em "Serenidade".
 Sugiro ao grupo e à coreógrafa, Priscilla Bogamil Quirino, o estudo de vídeos de coreografias e espetáculos de Oscar Araiz (1940), coreógrafo argentino que fez parceria ao longo de muitos anos com o Ballet da Cidade de São Paulo e outras companhias oficiais no Brasil, América do Sul e Europa. Vejam, por exemplo, este vídeo, disponível no youtube, da coreografia “O mar” (El mar), encenada pelo grupo de dança da Universidade Nacional de San Martin (Argentina). Reparem no uso espacial dos dançarinos, na qualidade dos movimentos e na maneira como incorpora as qualidades de movimento das águas do mar. Fica visível que os corpos dos dançarinos têm treinamento de balé, mas a composição extrapola os cânones clássicos, por isso a denominação “balé moderno”.


Os balés de repertório “La Fille mal Gardeé” (1786), encenado por uma estudante do Ballet Isadora Duncan, e “Pizzicato”, trecho do espetáculo “Sylvia” (1876), encenado pelo Ateliê da Dança, despertam a reflexão sobre como “reencenar” um “repertório” criado em outro contexto (importado de outro contexto) que, definitivamente, difere do brasileiro. 
Ballet Isadora Duncan com "La fille mal gardeé".
Além da assimilação dos passos, sugiro estudo do contexto de criação, da dramaturgia, ou seja, do sentido atribuído a cada gesto e a cada movimento, em seu momento de origem para ter a liberdade de atribuir um novo sentido, se for o caso. É importante que cada um desses detalhes faça parte do ato criativo e compositivo das coreografias, para desautomatizar a reprodução e dar ênfase à apresentação enquanto ato comunicativo, que promove experiências para além de comentários como “que bonito”, “que virtuoso”. Que aliem narrativa, gesto, movimento e técnica.
Ateliê da dança em "Pizzicato".
Discutimos reencenações de balés de repertório na roda de conversa realizada no sábado (27 set.), pela manhã. Nesse dia, Beatriz de Almeida deu o exemplo de como foi criado o “fueté”. Para além do virtuosismo – porque, afinal, chama mesmo a atenção tantos giros no mesmo lugar – ele foi encenado, pela primeira vez, segundo a professora, no espetáculo O Lago dos Cisnes (1877), para expressar a agressividade e impetuosidade do Cisne Negro (Odile). Aliar os passos ao sentido atribuído a ele, isso é dramaturgia.
 
Além dessas apresentações citadas, o Grupo Seishun apresentou "Yusetsu", que significa derretimento da neve, em japonês.
Grupo Seishun em "Derretimento da neve".

Nenhum comentário:

Postar um comentário